Da euforia a decepção. O que há de errado com o Inter Miami de Diego Alonso?

0
22

Desde seu anúncio como franquia da MLS em janeiro de 2018, o Inter Miami despertou a atenção do mundo inteiro pelo ousado projeto de ser uma referência em todos os aspectos e pelo fato de ter por presidente ninguém mais ninguém menos que David Beckham, o homem que mudou a liga dentro e fora de campo com sua passagem histórica no Los Angeles Galaxy.

Além disso, o projeto de um novo estádio, a contratação de um técnico vencedor, rumores de grandes estrelas, sem contar o fato de estar localizado em uma das cidades mais icônicas do planeta.

Com todos esses ingredientes, somados a um corpo diretivo reconhecidamente competente, tinham tudo para formar uma temporada inaugural para a história da liga…. porém os resultados até aqui tem mostrado exatamente o contrário. Com uma temporada aquém do esperado, Hamlet diria caso estivesse vivo, que há algo de podre no reino da Flórida. Mas o que de fato acontece com as garças reais?

Diretor consagrado, treinador vencedor e jogadores experientes: Garantia de sucesso?

Um dos primeiros movimentos de Miami para referendar seu audacioso projeto foi contratar um dos personagens fundamentais no sucesso recente do Atlanta United, Paul McDonough, ex-VP de futebol da franquia da Georgia e que chegou para ser o Diretor Esportivo e responsável direto pela montagem do atual elenco.

Campeão da Concachampions em 2017 com o Pachuca e em 2019, além do Clausura Mexicano com os “Tuzos” em 2016, Diego Alonso foi outra aposta que teve participação direta de David Beckham. Todas essas credenciais tornaram o uruguaio um nome certo para as ambições internacionais de um clube que já nasceu grande.

Em muitos casos, o segredo de um time está na mescla entre juventude e experiência e foi pensando nisso que desde a contratação de promissores jogadores do futebol sul-americano, passando pela contratação de um Rodolfo Pizarro que chamava a atenção de vários times europeus, até a aquisição de nomes com carreira consolidada na MLS, o elenco do Inter Miami parecia tomar boa forma para uma temporada promissora, ainda que houvessem lacunas naturais em um começo de trabalho.

NOME DO JOGADORPOSIÇÃOCLUBE DE ORIGEMIDADE
A.J. DeLaGarzaDefensorHouston Dynamo (MLS)32
Andrés ReyesDefensorAtlético Nacional (COL)21
Juan AgudeloAtacanteNE Revolution (MLS)27
Julián CarranzaAtacanteBanfield (ARG)20
Lee NguyenMeio-CampoLAFC (MLS)33
Lewis MorganMeia-AtacanteCeltic (ESC)23
Luis RoblesGoleiroNYRB (MLS)36
Matias PellegriniMeia-AtacanteEstudiantes (ARG)20
Nicolás FigalDefensorIndependiente (ARG)26
Román Torres Defensor Seattle Sounders (MLS)34
Rodolfo PizarroMeio-CampoMonterrey (MEX)26
Will TrappMeio-CampoColumbus Crew (MLS)27
Contratações de destaque do Inter Miami antes de sua primeira temporada na MLS

O começo trágico de temporada, a eliminação no MLS IS BACK e as tentativas de Diego Alonso

Com essas aquisições, a franquia de South Florida começou a temporada cercada de esperança, mas as duas derrotas no mundo pré-pandemia já ligaram o sinal de alerta desde então. Passados alguns meses, a equipe de Alonso tinha no torneio criado para marcar a volta do soccer em 2020 a grande chance de causar boa impressão, o que também não aconteceu. Foram mais três derrotas e uma eliminação precoce, em uma competição que parecia ideal para o time estreante dar a volta por cima.

No que tange a questão tática, na sua estreia o Inter Miami optou pelo 4-2-3-1 usado em boa parte da temporada, com variações para um 4-3-3 em boa parte dos jogos, lembrando a forma com que jogava nos Rayados campeões da CONCACAF em 2019.

Inter Miami Beckham Alonso

Dentro deste contexto tático, no setor de defesa tem sido feitas algumas variações, com a exceção do goleiro Robles. Nas laterais já foram usados Nealis, Sweat, Shea, Ambrose, Powell e até o zagueiro Figal , que tem sido usado na posição nos últimos jogos. Na zaga Reyes, Torres e Figal revezaram-se entre si durante muito tempo até a chegada de Leandro González Pirez. Torres já até foi negociado com o Seattle Sounders. No meio, Trapp e Ulloa começaram como volantes nos primeiros jogos, algumas vezes usando até o meia Nguyen na posição ou criando uma linha de 3 centro-campistas na ausência de Pizarro como peça central do meio. Já nas pontas, Morgan e Pellegrini eram usados como o desafogo da equipe. Morgan, aliás tem sido um oásis no meio do deserto de idéias que tem sido a esquadra do Inter. E por falar em deserto, Agudelo, Carranza e Robinson já passaram pelo comando de ataque, porém sem muito sucesso em um modelo de jogo que mesmo com essas variações, na prática, tratava-se de um jogo espaçado e que pouco extraia de seus melhores nomes como o seu camisa 10, Rodolfo Pizarro, que era peça chave do Monterrey de Alonso.

Inter Miami Beckham Alonso

Em um outro momento da atual campanha, sobretudo na derrota por 1×0 contra o D.C. United, houve uma tentativa por parte do treinador charrúa de jogar com três zagueiros, tal como fez no Pachuca campeão da CONCACAF em 2017, com Pizarro e Morgan atuando pelos lados e Robinson no comando de ataque. Porém um dos problemas dessa formação foi jogar com alas como Nealis e Sweat, que além de não atacarem, tampouco apoiarem bem, quase não jogaram nessa função em suas respectivas carreiras, além do fato de tirar o pouco de criatividade que havia no meio-campo e tirar a dinâmica do lado esquerdo de ataque de uma vez só ao mandar o camisa 10 mexicano fora de sua posição e sobrecarregando Morgan no lado direito, o que a certa altura já era uma jogada manjada por 10 entre 10 equipes da MLS.

E não se pode incorrer no erro de confundir variação tática com flexibilidade, pois em ambos os casos, Alonso lançou mão de esquemas que eram incompatíveis com as peças que ele tinha no momento, somado ao fato de não ter um ataque capaz de converter as jogadas criadas por Morgan e Pizarro, que eram muito mais fruto de suas individualidades do que de um aporte tático para o florescimento destas.

Chegadas de estrelas, formação de uma espinha dorsal e adaptação ao elenco: o que Diego Alonso precisa para evitar mais um vexame?

Com o o pior começo de uma franquia em seu primeiro ano com cinco derrotas nos cinco primeiros jogos, a chegada de González Pirez pareceu o primeiro passo para uma reação na temporada, que ganhou ainda mais fôlego com os anúncios de Blaise Matuidi e Gonzalo Higuain, que já chegaram aos Estados Unidos com status de reforços de peso para uma equipe carente de talento. Porém, mesmo para Gonzalez Pirez, que havia sido campeão com o Atlanta United e os recém-chegados, o ritmo de jogo e a adaptação ao que seu novo treinador busca impor, ainda se constituem como obstáculos para uma boa campanha no corrente ano, principalmente se levarmos em conta o encurtamento da temporada devido a situação atual em que o mundo se encontra.

Dito isso, ainda que os playoffs pareçam um sonho distante, é possível evitar o vexame das últimas colocações mesmo com um elenco ainda incompleto, mas com peças que o permitem melhores desempenhos e resultados. E o próprio o comandante deste elenco sabe que não pode mais insistir em uma ideia de jogo que por mais que o tenha feito vitorioso no futebol mexicano, encontra dificuldades de ser replicada no contexto atual e com as peças que possui.

O 4-2-3-1/4-3-3 dos tempos de Monterrey exigia da equipe uma capacidade maior de seus laterais nas duas fases do jogo, além de um comprometimento quase que religioso de seus homens de frente na hora da recomposição. Mas ele não tem a força de um Jesús Gallardo nas laterais e nem o comprometimento de um Rogelio Funes Mori para iniciar a recomposição de trás para frente. Alonso pode usar o mesmo esquema, porém com adaptações que podem fazer toda a diferença em seu trabalho, como tirar Figal da lateral para fazer dupla com LGP na zaga, usar laterais que não participem tanto da construção de jogo mas que sejam competentes no primeiro terço e mudar o foco do jogo dos lados para o meio do campo, onde ele terá mais qualidade com Matuidi e Trapp/Ulloa, podendo usar até mesmo os três para dar mais liberdade para que Pizarro possa acionar Morgan e Higuaín no ataque ou possa fazer triangulações na entrada da linha com Morgan e Pellegrini afunilando para o meio municiando o Pipita em uma formação com dois volantes.

O caminho para o sucesso na MLS provou ser mais longo do que o Beckham, McDonough e Diego Alonso esperavam, mas ainda se provou possível diante das muitas coisas positivas que tem acontecido em torno desta nova, pujante e arrojada franquia, que a despeito do começo acidentado, ainda tem condições de refazer a rota e chegar ao seu destino final, que é se tornar não apenas um modelo a ser seguido, mas um estandarte de uma liga que não quer apenas ser diferente, como também referente.

(Capa: Reprodução Twitter/Inter Miami)