O advogado e analista Rafael Martins traz mais um capítulo da coluna A Lei do Soccer, dessa vez explicando sobre o mercado na MLS
A temporada de 2021 da MLS irá começar no próximo dia 16 de abril. Enquanto a bola não rola, os clubes se movimentam para montar seus elencos para a próxima temporada. O mercado de transferência de atletas, oficialmente aberto em 10 março, se mostra bastante movimentado, o que traz uma grande expectativa a respeito da temporada 2021, que tende a ter muita competitividade entre os clubes e uma maior qualidade técnica dentro das quatro linhas.
Mas além das quatro linhas, para os amantes do Soccer, entender o mercado de transferências da principal liga americana de futebol pode não ser uma tarefa fácil. Slots, Salary Cap, Allocation Money, Discovery list, são termos e conceitos usuais quando falamos sobre montagem de elenco, contratação de atletas e organização financeiras envolvendo times da Major League Soccer. O mercado e suas regras são complexos.
Para que se tenha uma ideia, o Jornal Britânico The Guardian publicou uma matéria em março de 2018, destacando que 50% dos atletas que atuavam na Major League Soccer, daquela temporada, não conheciam as principais regras que envolviam uma transferência na MLS.
Mas calma, pensando em simplificar esse “bicho de sete cabeças”, enquanto a liga de 2021 não começa, o Território MLS traz uma série para você que deseja entender as principais regras do mercado de transferências mais complexo do futebol.
Serão quatro artigos, trazendo para você as principais regras e peculiaridades que circundam a montagem de um elenco da MLS.
Bem vindo a “Lei do Soccer – Descomplicando o Mercado”.
SINGLE ENTITY – ENTIDADE ÚNICA
Antes de destacarmos e tratarmos sobre os principais dispositivos que regem o mercado de transferências da MLS, é essencial a compreensão de um conceito muito importante que difere a MLS das outras ligas de futebol ao redor do mundo.
Sempre quando tratarmos sobre a MLS, o ponto que deve estar fixado em nosso entendimento é; a MLS controla a liga.
A MLS se autodenomina uma liga de “entidade única”. Isso significa que toda a estrutura da liga está centralizada na própria MLS. Através dessa centralização, a MLS traz para si o controle de gestão das regras de contratação de atletas e os gastos de cada clube dentro da sua liga. O objetivo principal desta centralização é evitar um desequilíbrio entre as equipes da liga e por consequência a desvalorização do seu produto.
Todo clube que deseja fazer parte da MLS, dentre outras exigências, precisa pagar um valor de entrada, o franchise fee. Com este valor pago, o clube, através de seu dono, torna-se parte do conselho de direção da Liga, que tem como seu representante máximo, o Comissário, e passa a ser sócio da Liga junto com os demais donos das franquias participantes.
Por isso, esse controle também tem seus reflexos no mercado de transferências. A MLS controla as aquisições de jogadores através de um conjunto ímpar de regras criadas para impedir que suas equipes possam competir entre si de modo desigual.
Tal poder centralizado, encontra-se previsto no próprio acordo realizado entre os Atletas e a liga, que prevê:
[…] A MLS, no exercício de suas funções de gestora, deve, em adição a seus outros direitos inerentes e legais de gerir seu negócio, inclusive a direção e controle dos Times, ter o direito exclusivo de, a qualquer momento e de tempos em tempos, tomar qualquer medida que considere apropriada para o gerenciamento de seu negócio, incluindo, mas não limitado ao direito exclusivo de determinar quando, onde, como e sob que circunstâncias ela pretende operar, suspender, descontinuar, vender ou mudar, e determinar as condições e regras sob as quais os Times deverão jogar futebol.
Importante destacar que a MLS não interfere no poder de decisão dos clubes nas contratações dos atletas. Dentro das suas limitações financeiras, os clubes podem adquirir os jogadores que desejarem. Porém, todo atleta que atua por um clube na MLS, assina seu contrato com a própria MLS e não com o clube. Após a assinatura com a MLS, o jogador é designado para atuar pela equipe que lhe contratou.
Da mesma forma, quando um jogador da MLS é transferido para um clube de fora da liga, este clube paga a taxa de transferência para a MLS, que então repassa para a equipe.
A Liga exerce esse controle de gestão através de um grupo de regulamentos, os quais são necessários para que se possa compreender e entender o modo que a relação entre o mercado, liga, clubes e atletas são regulamentados.
REGULAMENTOS
Conforme falado no começo desta série, descrever as regras da MLS não é uma tarefa fácil. Isso porque, elas estão sujeitas a inúmeras exceções e condições especiais e nem sempre são explicitadas claramente em qualquer texto disponível publicamente. Outro ponto, é que referidas regras mudam com frequência, o que faz com que os fãs do soccer tomem conhecimento delas, apenas, no contexto de transações específicas
Essa relação é tão complexa, que o mercado de transferências de atletas e a relação entre jogador e clube são regidos por três regulamentos diferentes, quais são;
- MLS Roster and Regulations
O “MLS Roster and Regulations” é o regulamento da MLS que legisla sobre os principais aspectos envolvendo transferências e controle financeiro pela liga. No site da MLS é possível ter acesso ao teor completo deste regulamento.
É neste regulamento que encontramos a definição de modelos usados unicamente pela MLS, tais como; o Designated Player Rule, General and Targeted Allocation Money, Discovery List e outros que iremos abordar em breve.
- Collective Bargaining Agreement (CBA)
Este regulamento já foi abordado anteriormente aqui no Território MLS. Para saber de forma mais específica sobre este regulamento, basta Clicar aqui.
Mas em suma, o CBA é um contrato escrito, legalmente aplicável, que dura por um certo período de tempo, firmado entre a gerência de um estabelecimento e seus funcionários, representado por um sindicato independente. No caso do Soccer, este contrato é firmado ente a Major League Soccer (o comissário e os proprietários das equipes) e a Major League Soccer Player Union (Associação de Jogadores da MLS).
Nesse caso, o Sindicato e a MLS, através do CBA, ditam as regras dos contratos dos jogadores, bem como as negociações, a distribuição de receita e o teto salarial, entre outras coisas.
- Regulation on the Status and Transfer of Palyer (RSTP)
Este regulamento estabelece regras globais e vinculativas relativas ao status dos jogadores, à sua elegibilidade para participar no futebol organizado e à sua transferência entre clubes pertencentes a diferentes federações. O RSTP é o principal regulamento feito pela FIFA e a sua aplicação na MLS esta prevista no CBA;
“As partes reconhecem que a FIFA e a USSF têm direitos que afetam a condução do negócio da MLS, e que a MLS poderá implementar imposições mandatórias da FIFA e/ou requisições da USSF sem ter que negociar sobre a decisão de implementar tais imposições obrigatórias. Se tal imposição obrigatória for resultar em (a) uma mudança no benefício do Jogador sob uma regra ou regulamento existente; ou (b) a adoção de uma regra ou regulamento que poderá mudar um benefício do Jogador sob uma regra ou regulamento, ou impor uma obrigação aos Jogadores que não havia, a MLS e o Sindicato deverão negociar, de boa-fé, sobre os efeitos da implementação de tal imposição mandatória.”
CONCLUSÃO
O Pontapé inicial foi dado. Entender que a MLS controla as operações da liga é o ponto de partida para adentrarmos em conceitos mais específicos da MLS. Além disso, entender quais são os principais regulamentos que regem essa relação é primordial para a partir de agora falarmos sobre como um atleta é contratado por um clube na principal liga norte-americana de futebol.
(Capa: Divulgação/Orlando City)